Com 50 anos de carreira, o poeta Bernardo Vilhena participou do movimento Poesia Marginal, nos anos 1970, e é compositor de cerca de 500 músicas que estão no coração dos brasileiros e no nosso rock brasileiro, como “Menina Veneno”, “Vida Bandida”, “Vida Louca Vida”, entre outras. O que faltava a ele? Estrear na área de ficção. E é com “Vidas em Transe” (Rebento Editora, 2024) que o carioca dá mais esse passo, aos 75 anos.
Sergio Cohn, (editor/poeta) que assina o prefácio do livro, diz que a poesia de Bernardo dialoga diretamente com a dramaturgia. Era uma questão de tempo começar a testar outro gênero. “O fato é que desde 2006 escrevi três romances. Vidas em Transe foi o primeiro”. Segundo o autor, esses 18 anos foram importantes para confirmar que essa atração pelo mundo da ficção ia além da contínua leitura de romances desde a adolescência. “Era natural. Ainda mais depois de escrever três em seguida e gostar do que estava fazendo”.
“Vidas em Transe” começa com a história de um casal de portugueses que chega ao Rio de Janeiro na primeira década do século XX. O romance atravessa três gerações desta família e seus amigos. Os personagens vivem o instável dia a dia de conflitos pessoais e políticos, duas guerras mundiais, a ditadura militar no Brasil e as buscas pelo ideal de liberdade. Ao mesmo tempo, constroem relações amorosas, criam seus círculos de amizades e, até mesmo, imaginam Paris como o ponto de fuga. O vetor é o contexto político da ditadura e os diferentes efeitos que ela causava no dia a dia das pessoas, de acordo com a idade, com a consciência política, com seu papel na sociedade e com o envolvimento de cada um.
“Delimitei o curso da história até a década de 70 porque ainda mantinha fresco na memória a vida anterior à era digital, para não cair em armadilhas e facilidades de comunicação que se tem hoje em dia. É a despedida de uma época, o adeus a uma vida sem computador”, pontua Vilhena que, aos 18 anos, fez o primeiro curso de computadores que a IBM abriu para pessoas de fora da companhia.
É impossível falar da obra de Bernardo e deste livro sem lembrar a relação do autor com o Rio de Janeiro, cidade pela qual ele já declarou um amor histórico e geográfico. “Sou um apaixonado pela cidade. Conheço muitos bairros, fui nascido e criado na Zona Sul, mas também morei no subúrbio, no Jacaré. Tinha parentes e frequentava o Cachambi, Bangu, Riachuelo, Tijuca, Santa Teresa, meu pai nasceu na Saúde. Convivi e continuei convivendo com esses bairros e a galeria imensa de pessoas, suas diferenças sociais e culturais. Tudo isso se reflete no estudo, no trabalho de desenvolver os personagens e escrever este livro”.